Texto:Cláudia Rodrigues
O
domingo do dia 17 de junho promete amanhecer rosa choque em várias capitais do
Brasil com a Marcha do Parto em Casa. Porto Alegre, Florianópolis, Salvador, Recife, Rio de Janeiro, São
Paulo, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília, Natal e mais algumas cidades do interior
serão palco de manifestações das mulheres pelo direito de escolher o local em
que querem parir, incluindo aí não apenas a recusa imediata de submeterem-se à
posição em decúbito dorsal e terem as pernas amarradas em maternidades públicas
e privadas do Brasil, mas principalmente o direito, garantido por lei, de parir
em casa, como quiserem e na posição que
acharem mais confortável no momento da expulsão.
As coisas pareciam calmas na área e,
ainda que os partos domiciliares mal batam em 2% no país, o interesse por essa
opção tem crescido no Brasil. As mulheres mais antenadas estão começando a se
dar conta que parir em casa pode, entre outras vantagens, ser uma forma segura
de não passar pela violência obstétrica http://www.partocomprazer.com.br/?p=2333
Mais do que isso, pode ser uma maneira seguramente amorosa de não sofrer e não
permitir que o filho recém-nascido sofra intervenções que podem vir a ser
prejudiciais à saúde física e emocional da dupla mãe-bebê, afinal o bebê
saudável está, segundo as evidências, http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v45n1/1717.pdf
mais seguro no colo da mãe e mamando na
primeira hora de vida imediata e não sendo medido, pesado e vacinado antes
mesmo de mamar.
Mas então, afinal, se são só 2% e se
podem escolher parir em casa com os poucos obstetras e parteiras disponíveis, para
que manifestação em tantas praças públicas?
É que essa pequena parcela da
população está sendo ameaçada de perder a assistência que quer e acredita
merecer por represálias cada vez mais insistentes dos conselhos regionais e
federal de medicina do país.
Um dia após uma matéria sobre a segurança e legitimidade do parto domiciliar,
feita pelo Fantástico, programa da Rede Globo de televisão, o Conselho Regional
de Medicina do Rio de Janeiro-CREMERJ- enviou denúncia http://www.jb.com.br/rio/noticias/2012/06/11/cremerj-abrira-denuncia-contra-medico-que-defende-parto-domiciliar/
ao Conselho Regional de Medicina de São Paulo-CREMESP-
contra o obstetra Jorge Kuhn, que concedeu entrevista ao programa dominical. http://globotv.globo.com/rede-globo/fantastico/t/edicoes/v/parto-humanizado-domiciliar-causa-polemica-entre-profissionais-da-area-de-saude/1986583/
Muito
amena, rápida e de pouca profundidade, como é praxe do estilo Rede Globo, a
matéria sequer falou das evidências que comprovam ser o parto domiciliar tão
seguro quanto o hospitalar para as gestantes de baixo risco. O obstetra Jorge
Kuhn afirmou com veemência que apenas gestantes de baixo risco devem optar pelo
parto domiciliar. E mais nada, a entrevista com ele foi editada em cima dessa
fala que reporta os espectadores exclusivamente para a questão da segurança,
sem abordar as muitas vantagens dos partos domiciliares já comprovadas por
estudos da Medicina Baseada em Evidências.
Rapidamente
alguns obstetras simpatizantes e praticantes da humanização do parto e do
nascimento se uniram às redes de mulheres que exigem que se cumpra a lei da
liberdade de escolha pela posição e local do parto; criaram uma carta aberta e
uma petição pública http://partodoprincipio.blogspot.com.br/2012/06/carta-aberta-em-repudio-ao-cremerj.html
Mais do que defender um colega, a
carta e a petição exigem publicamente que os conselhos regionais e federal de
medicina respondam com base em evidências às ameaças e atitudes arbitrárias
baseadas em crenças médicas derrubadas por sucessivos estudos científicos nos
últimos anos.
“Não é possível admitir
o arbítrio e calar-se diante de tamanha ofensa ao direito individual. Não é
admissível que uma corporação persiga profissionais por se manifestarem
abertamente sobre um procedimento que é realizado no mundo inteiro e com
resultados excelentes. A sociedade civil precisa reagir contra os interesses
obscuros que motivam tais iniciativas. Calar a boca das mulheres, impedindo que
elas escolham o lugar onde terão seus filhos é uma atitude inaceitável e fere
os princípios básicos de autonomia.
Neste momento em que o Brasil ultrapassa
inaceitáveis 50% de cesarianas, sendo mais de 80% no setor privado, em que a
violência institucional leva à agressão de mais de 25% das mulheres durante o
parto, em vez de se posicionar veementemente contrários a essas taxas absurdas,
conselhos e sociedades continuam fingindo que as ignoram, ou pior, as acobertam
e defendem esse modelo violento e autoritário que resulta no chamado
"Paradoxo Perinatal Brasileiro". O uso abusivo da tecnologia
contrasta com taxas gritantemente elevadas de mortalidade materna e perinatal,
isso em um País
onde 98% dos partos são hospitalares!
Escolher o local de parto é um DIREITO humano
reprodutivo e sexual, defendido pelas grandes democracias do planeta. Agredir
os médicos que se posicionam a favor da liberdade de escolha é violar os mais
sagrados preceitos do estado de direito e da democracia. Ao invés de atacar e
agredir, os conselhos de medicina deveriam estar ao lado dos profissionais que
defendem essa liberdade, vez que é função da boa Medicina o estímulo a uma
"saúde social", onde a democracia e a liberdade sejam os únicos
padrões aceitáveis de bem estar.
Não podemos nos omitir e nos tornar cúmplices
dessa situação. É hora de rever conceitos, de reagir contra o cerceamento e a
perseguição que vêm sofrendo os profissionais humanistas. Se o CREMERJ insiste
em manter essa postura autoritária e persecutória, esperamos que pelo menos o
Conselho Regional de Medicina de São Paulo (CREMESP) possa responder com
dignidade, resgatando sua função maior, que é o compromisso com a saúde da população.”
O
cerco contra as atitudes arbitrárias dos conselhos de medicina está fechando e
se os médicos que apoiam as políticas dos conselhos acham que estudaram demais
para graduarem-se e que todas as pessoas que criticam os abusos médicos e as
iatrogenias são invejosas e gostariam de ser médicas; é bom rever conceitos e
ler mais publicações baseadas em evidências porque é isso que as mulheres
comuns, leigas de todas as profissões, e mesmo as não graduadas andam fazendo
para reivindicar direitos e uma prática baseada em recomendações científicas,
não em maus hábitos, crenças pessoais e interesses particulares dos obstretas.
A
perseguição às parteiras na década de 1940 praticamente baniu a prática do
parto domiciliar no Brasil. O parto, inicialmente um ato fisiológico, feminino,
um verbo, uma ação, passou a ser um ato médico e a cesariana, um ato médico de
fato, começou a ser usada para desqualificar a potência do corpo feminino, como
explica tão bem o osbtetra Marcos Leite dos Santos, em tese pela Universidade Federal
de Santa Catarina UFSC:“A história da
obstetrícia é a história de uma luta em busca de poder. A história da
obstetrícia é a história da exclusão da mulher, da depreciação do universo
feminino, da transformação de uma atividade inerentemente feminina, natural e
fisiológica em um procedimento médico, androcêntrico, tecnocrático e cheio de
riscos imanentes” http://www.tempusactas.unb.br/index.php/tempus/article/view/829/792
O
modelo hospitalocêntrico no Brasil é tão arraigado que quando uma mulher não
consegue segurar a expulsão do bebê e acaba parindo na segurança do lar,
sozinha ou assistida por bombeiros, é removida imediatamente para um hospital
em vez de ser atendida em casa por uma equipe multidisciplinar do posto de
saúde mais próximo. Fique claro que ao serem removidos, ela e o bebê correm
riscos maiores de contrair infecções ou vírus.
Enquanto
isso, na Alemanha, as mulheres não somente podem escolher como, onde e com quem
querem parir, como também podem optar por um parto considerado como de risco
maior mesmo pelos humanistas, como o parto desassistido.
Enfim, é muito retrocesso, em vez de estarmos
discutindo o quanto um parto desassistido pode ser mais perigoso do que um
parto assistido por profissionais da saúde que estudaram as várias indicações
para remoção etc, estamos discutindo se um parto é um ato médico e
necessariamente hospitalar, estamos discutindo por que perder 2%, 5%, talvez
daqui 20 anos 30% de clientes parturientes, é tão importante para a corporação
política e econômica da medicina.
E nessas horas a única coisa que vale é mesmo as
mulheres irem para as ruas com os cartazes que gritam: "Não precisamos do seu
Conselho para parir".
Em Porto Alegre a marcha vai ser na Redenção a partir das 13,30h.
E na tua cidade também tem, confere aqui na TPM
Olá, será que podemos usar a arte em fundo preto para impressão em camisas ou adesivos em apoio às diversas marchas que estão sendo organizadas?
ResponderExcluirSylvana (Ishtar Brasilia)
Penso que sim.
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