segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Adoráveis adolescentes

Por Cláudia Rodrigues
Instabilidade de humor, falta de sono na madrugada e excesso pela manhã, preferência por carboidratos, oscilações radicais entre insegurança e sentimentos de superioridade são algumas das tendências de comportamentos largamente pesquisadas nos adolescentes nas últimas décadas. A explosão hormonal que traz seios, músculos, pêlos e estatura não é um fenômeno meramente fisiológico ou hormonal sem ligação com o cérebro; é impactante do ponto de vista emocional e na prática esbarra em problemas cotidianos que naturalmente irritariam outras pessoas em qualquer idade. Assim como nas outras fases de revoluções hormonais, não é apenas o efeito dos hormônios o responsável direto pelas variações de humor, mas a novidade de um novo corpo que se forma, impelindo-nos a um viver diferenciado, com outras necessidades. É um novo corpo e ele chega exigindo abandono de atitudes que antes só traziam prazer. Pede novas atitudes, novas formas de prazer. Só que entre o desejo, a pulsação e o crescimento natural do novo no corpo, existe o cultural, o meio e as influências poderosas de tudo o que vem de fora. Os sentimentos de perda quando emerge o novo corpo, menos infantil, mas ainda não definido como um corpo adulto, clamam por estratégias emocionais e flexibilidade psíquica nem sempre abundantes no universo dos adolescentes. O processo é particularíssimo e depende também do entorno, da continência familiar e de quanto esses adolês, especialmente os urbanos, foram violados ainda na infância pelos apelos de milhares de interferências pós-pessoais, as que se impuseram de fora para dentro de seus corpos. Uma menina de 13 anos pode levar seis meses para entender que não gosta mais de brincar de bonecas. Ela pega suas bonecas e penteia, muda de lugar, sente uma tristeza imensa, nem passa por sua cabeça doar as bonecas, mas não compreende porque não acha mais graça em fazer aquilo que vem fazendo desde que se conhece por gente. Ela pode fugir para o computador, pode tomar um sorvete com a turma, mas necessariamente vai viver a transição da criança para a moça no corpo dela e essa experiência não deve ser menosprezada porque não é feita só de vantagens, de um lindo mundo romântico de namoricos. Amadurecer sempre dói em qualquer idade, mas na adolescência, talvez pela consciência recente que na infância não tínhamos e pela inexperiência, que na vida adulta já não nos assusta, seja um processo mais facilmente desestabilizante em termos emocionais, corticais e sociais. Para completar, o adolescente mexe com sentimentos não muito nobres dos adultos que convivem com eles; sentimentos hostis como a inveja. O adolescente à priori só tem vantagens aos olhos dos adultos: possui muito mais liberdade de ir e vir do que as crianças, pouca responsabilidade, muita energia para o prazer. Além disso, não importando se é gordinho ou magro para os padrões da moda vigente, todo adolescente tem um frescor juvenil que o torna necessariamente belo. Existe uma beleza esplendorosa na juventude, que independe do padrão social e econômico. Não tem nada a ver com o tamanho do nariz, é uma força vital que o adulto começa a perder ali pelos 25 anos, uma energia que se não foi bem vivida na adolescência e na juventude, só pode resultar em inveja por parte dos pais e consequentemente projeção de frustrações. Essa inveja aparece em frases como: “no meu tempo não era assim, eu na sua idade já fazia isso e aquilo, você nem parece que já tem essa idade, não cresce, não amadurece.” Para o adolescente, que não tem consciência da sua energia tanto quanto não tem de suas incertezas e inseguranças, ser colocado como um futuro adulto incapaz de chegar aos pés dos genitores, que às vezes ele despreza, pode ser algo profundamente deprimente, revoltante ou paralisante. O deprimido desenvolverá tendências anti-sociais, o revoltado é o melhor candidato a depender de drogas e o paralisado pode chegar ao cúmulo de não conseguir passar de ano na escola por medo de crescer e realizar o pior de seus temores: não conseguir chegar aos pés dos pais. A distância que os adultos em suas vidas atribuladas vivem das necessidades dos adolescentes pode ser tão grande a ponto de impedir qualquer contato: não há trocas, o filho não mostra aos pais os melhores vídeos que catou no youtube, os pais não achariam a menor graça mesmo. Aos poucos os almoços, os jantares em família vão desaparecendo, pais e filhos viram estranhos dentro de casa, os pais vendo os filhos como marmanjos que terão que sustentar por longa data ainda, os filhos vendo os pais como inimigos íntimos, algozes que soltam ou seguram uma graninha. Ora para se livrarem de suas presenças, ora para impedirem a diversão com a turma. É um lugar muito solitário o do adolescente e o refúgio está na turma, nos primeiros amores. A turma fortalece o anjo e o monstro dentro do adolescente; a turma é adrenalina, é paz e amor, é desafio, experiências corporais, afetivas. Encontrar uma boa turma que nutre o coração do adolescente é como voltar ao útero materno por algumas horas do dia. Ali ele se sente compreendido, alimentado, entre os seus, ainda que nem sempre a realidade seja exatamente o mar de rosas que ele vê. O segredo de um adolescente-pessoa, que não insulta, não bate porta e resolve suas questões com os pais por meio de conversas, foi tecido mês a mês, ano a ano durante toda a vida dele. Com um bom vínculo com os pais, que precisa ser mantido ainda na adolescência nas folgas da turma, as chances de ter um aborrecente em casa, diminuem bastante. Talvez os adultos precisem rever seus conceitos em relação aos adolescentes porque esses seres em transição podem ser incrivelmente agradáveis com suas críticas, idéias, fantasias e ilusões pertinentes à idade. A irritação e o desprezo aos adolescentes, aos jovens e estudantes precisa ser repensada pelos adultos em geral, deveria ser revista pela mídia que dá pouca voz aos movimentos estudantis e principalmente deveria ser banida de nossos lares.

2 comentários:

  1. Ótimo blog. Excelente post. Confesso que essa é a fase que mais me assuta vivenciar com minha filha. Ainda está longe(ela tem apenas 1 aninho) mas, como você falou, é agora que vou lançar as bases da nossa relação futura, que torço para que seja uma parceria e não um confronto.
    Obrigada pela lucidez das palavras e por lançar uma nova luz na minha visão um tanto impregnada desse clichê: adolescente=problemas.

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