quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Engatinhando pela Casa

Por Cláudia Rodrigues
Tami engatinhando

As coisas têm andado realmente rápidas e eu aprendi no final dos nove meses a engatinhar. Agora já estou com quase onze e pareço mais um lagartinho esperto. Em um minuto estou aqui e em outro já estou lá. Você, que não via hora de admirar-me engatinhando, está até com saudade dos tempos em que eu ficava do carrinho para o colo, do colo para o berço. Os adultos realmente tinham maior poder sobre os meus atos insensatos.

É verdade, mãe, que não tenho a menor sensatez e tanto faz privada ou inseto, sapato ou laranja. Enxerguei peguei, apertei e é claro, coloquei na boca para averiguar melhor. Você anda de cabelo em pé atrás de mim e eu não dou mole para armários fáceis de abrir, panelas, controle remoto, plantas...Sou um verdadeiro Charles Darwin em exploração pela casa. Minha maior frustração é que tem muita coisa proibida, mas você, como boa mãe de um bebezão de dez meses, está aprendendo a liberar um pouco para que eu possa entender o significado do sim e do não. É difícil saber o que pode e o que não pode, mas vou aprendendo.

Um feriado desses você resolveu encarar um almoço caprichado, mesmo sabendo que seria difícil conciliar todo o preparo da comida comigo engatinhando pela casa. Você teve uma idéia ótima: abriu o armário das cumbucas de plástico, que estavam ao meu alcance, e começou a cortar legumes, picar a cebola e os temperos.

Primeiro eu achei um recipiente bem grande e fiquei uns cinco minutos averiguando o produto. Era realmente duro, inquebrável mesmo. Depois joguei-o longe pois lá no fundo do armário tinha um de tom alaranjado muito bonito. Fui pegar, mas bati com a cabeça na porta do armário e comecei a chorar. A cebola e os temperos já estavam picados e os legumes e folhas já lavados. A fralda estava vencida e então fizemos uma pausa para a troca. Quando voltamos para a cozinha, insisti no armário. Dessa vez você teve a brilhante idéia de me oferecer uma colher de pau. Eu consegui pegar a tigela cor de laranja e fiz a bendita virar um belo de um tambor. Logo depois achei uma pilha de garrafas de plástico vazias. Adorei quando você colocou água em uma delas para eu brincar. Eu sacudia a garrafa com água e depois sacudia as que estavam sem água. Eu e Albert Einstein: é incrível como as garrafas são diferentes com água e sem água.

Você foi levando, conversava comigo, me chamava de lindo e quando eu já estava ficando entediado e com vontade de mamar, o almoço estava no fogo. Nova pausa. Você lavou minhas mãozinhas, meu rosto, eu mamei em você e dormi finalmente, cansado de tanta malandragem em meu colchão do dia, que fica ao lado do berço no chão do meu quarto. Só então você percebeu que não havia espaço para caminhar na cozinha, de tanta coisa jogada. Em um instante você catou tudo, colocou a mesa e ainda sobrou um tempinho para ler antes da comida ficar pronta.

Quando você e o papai almoçavam tranqüilamente aproveitando meu suposto sono, escutaram um barulhão e correram para ver o que estava acontecendo. Era eu, para lá de acordado, já havia virado toda a minha caixa de brinquedos e acabara de abrir a gaveta das meias do papai, a tal que fez o barulho quando caiu no chão. Eu nem me machuquei, mas que dei um susto em vocês eu dei e que assustei um pouco, isso também. Mas vocês, quando me viram, começaram a rir, parecia que Poltergeist, o fenômeno, havia passado pelo quarto. Estava tudo mexido e remexido e como na cozinha, antes do almoço, no quarto também não sobrava espaço para alguém caminhar. É que estou nessa fase linda, sabe mãe, em que dou o maior trabalho e preciso de uma combinação de atenção e liberdade para fazer minhas peripécias. Por isso, fique atenta e retire do meu alcance tudo o que pode ser perigoso, solte-me por aí para eu poder pesquisar o ambiente do jeito que eu bem entender, é importantíssimo para minha motricidade, essa liberdade de movimentos.

Agora estou junto com vocês almoçando no cadeirão. Sinto-me muito importante depois que conquistei esse espaço e adoro família reunida em volta da mesa. Até me comporto e já parei de jogar a colher no chão para você catar, coisa de bebês de sete, oito meses. Ando mesmo muito disposto a acertar a colher na boca, mas ainda é um pouco difícil e às vezes vai com a mão mesmo. Mas que eu como eu como, ora você interrompe seu almoço e oferece uma colherada, ora eu pego com minhas mãos, estamos descobrindo que esse momento é de puro prazer e alguma paciência; em vinte minutos eu termino bem minha refeição.

Só não gosto e então implico mesmo, quando você entra numas de forçar e se apressar, até prefiro que outra pessoa ofereça com calma o almoço; bebê de dez meses quando é contrariado, aí mesmo é que teima. Quando você se deixa guiar por mim sem sair de seu troninho de mãe, quando vai conversando, olhando nos meus olhos, falando que é bom, estalando seus lábios, em contato de verdade, não tem erro, tudo dá certo.

Eu já tenho uma certa inteligência privilegiada, não sou facilmente engambelado e já busco levar vantagens, como adiar a troca de fraldas, por exemplo. Quando você vem com a fraldinha limpa e eu estou brincando, fujo mesmo, mas isso pode ser motivo de diversão, com um pouquinho só de paciência você consegue convencer-me a trocar a fralda e em troca leva de brinde um bebê bem-humorado.

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