terça-feira, 25 de setembro de 2012

Barbie-maezinhas produzidas pela mídia

Texto:Cláudia Rodrigues 


Já faz algum tempo que as revistas femininas investem na desculpabilização materna. O auge desse movimento foi na década de 1980, quando a mulherada brasileira (de)formadora de opinião resolveu encarar os dias e noites de nova mulherrrr. A revista Nova mantinha uma editora linha dura, que depois foi também editora da Cláudia, a pior fase da Cláudia, quando as mães foram perseguidas dentro e fora da redação. Qualquer jornalista com filho doente era execrada, não foi caso único a demissão de mulheres na volta da licença-maternidade.

O grande mote da discussão no submundo dos almoços da executiva era o absurdo de viver culpada! Ser mãe não deveria ser sinônimo de viver culpada e tome-lhe pautas de "volte ao cinema em 30 dias após o parto"; "seu marido também necessita de seu amor"; "mamadeira sim, por quê não?"
Depois de uma arrefecida, muito breve e muito tênue, das novas mulheres como chefes e editoras de redação, o movimento está a voltar com força. A Pais & Filhos está com uma página do facebook batizada como "Culpa, não!"

 

A confusão que nunca foi resolvida lá atrás sobre amor, sentimentos maternos, intuição sobre o que pode ser melhor para a criança, desapego egóico, descoberta de nova identidade durante a após a fase simbiótica, tudo isso continua levando o nome de culpa e pior: considerado errado!

O sentimento de culpa agregado à sexualidade, a padrões morais, a coisas que trazem infelicidade ao prazer genuíno não é em nada parecido e nem tem nada a ver com o que uma mulher pode vir a sentir e experienciar após dar à luz uma criança.


O que se considera "culpa materna", que é sentir que não se está fazendo bem o bastante, por compreender que o desenvolvimento natural de um bebê exige um novo comportamento da mulher, menos egoísta, menos egotista do que ela vinha mantendo até a maternidade, deve ser um sentimento levado a sério, porque ele pode e rotineiramente é um sentimento bom, de reflexão e muitas vezes de revisão de atitudes.  

Mais do que revisão de atitudes pessoais, revisão de nossa visão feminina como cidadãs. Mais vale questionarmos o tempo curto da licença-maternidade, que não acompanha a demanda de amamentação e cuidados em qualidade e quantidade que um bom desenvolvimento dos bebês necessita, do que atenuar a culpa, entregar bebês para serem terceirizados por 12 horas em creches, como se fossem orfãos de mães vivas e ausentes.

Como lutar por uma licença-maternidade maior para todas as mulheres se ficamos puxando o saco do mercado?  

Como lutar a favor de uma alimentação saudável, se ficamos reafirmando que as papinhas industrializadas nos ajudam a ter mais tempo para ficar com os bebês?

O que há colegas?
Nota ZERO para editoras e repórteres que promovem o complexo de "menasmains", essa fabricação em série de mulheres estimuladas a não viver, não sentir e não realizar uma maternidade consciente, a comportarem-se de maneira infantil e dengosa diante da gestação, do parto, do pós-parto, da amamentação, da educação, da alimentação dos filhos, delegando-os ao mercado, delegando-se ao mercado como vaquinhas de presépio.

As mulheres têm direitos à diferença na arte de maternar e acima de tudo a uma informação de qualidade, baseada em estudos sérios sobre o que é melhor para a criança e para a mulher-mãe, porque é ridícula essa ideia de que a vida após a maternidade é uma vida de solteira momento plus mother e de que os bebês são um saco de batatas que só servem como troféus para mostrar em shoppings.

A maternidade consciente traz como agregação fundamental a pouco trabalhada ideia e prática de não-maternidade consciente, mas só podemos entrar nesse tema com a intensidade e profundidade que merece quando as caras editoras resolverem desmistificar a ideia de que existe uma maternidade perfeita: a de barbie-maezinha.

6 comentários:

  1. Claudia, que texto fantástico! Eu não tinha lido ainda, mas expressa tudo o que eu penso.
    Parabéns, vc sempre assertiva e indo direto ao ponto. Texto ótimo de ler. Já linkei num post que fiz hoje sobre o assunto (desdobramento de outros, meus e de outras nblogueiras).
    Beijos

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  2. Aplaudo seu texto. Acho que com um mínimo de visão crítica podemos vislumbrar as empresas por detrás de cada tema discultido no "Culpa, não". A culpa, assim como o medo, coage, então, ao invés de discutir a libertação da culpa preferem apresentar medidas paliativas, sem que as mulheres possam elaborar esse sentimento e viver a matenidade de forma saudável. Mais uma vez, parabéns. Abraços.

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  3. Muito bom, querida. Você consegue escrever exatamente o que penso. Lutemos por nossos direitos. Briguemos com o sistema.

    O que mais vejo blogosfera afora são mães apontando o dedo na cara de outras mães e isso, com certeza não leva a lugar algum.

    Parabéns, me senti contemplada!

    Beijo grande.

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  4. Adorei! Tem muitas mulheres que não fazem a mínima ideia do quão trabalhoso e transformador é ter um filho. Dá trabalho sim! É difícil pra caramba! Mas pode ser a melhor coisa da vida de uma mulher ou casal, basta querer, se entregar, viver...

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  5. Claudia, que texto massa! Sou também jornalista e mãe. Senti-me de alma lavada com tuas palavras. Há pouco tempo precisei me demitir de um escritório de comunicação onde só consegui ficar 15 dias: eu tinha que me afastar 12 horas da minha filha, se segunda a sexta. Obrigada pelo seu texto. Já está no meu facebook. Show!

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  6. Claudia, obrigada pelo texto! Também sou jornalista e mãe. Recentemente precisei me demitir de um emprego onde consegui permanecer somente por 15 dias: precisava me ausentar de minha filha durante 12 horas, se segunda a sexta. Valeu, querida! Já está no meu facebook.

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