Por Cláudia Rodrigues
aquelas regras hipócritas. Chegou aos 15 anos, idade que achava brega, tinha vergonha de confessar, disfarçava dizendo que já havia passado dos 14 ou estava com quase 16. "A solidão era seu mestre, martírio sua recompensa". Aos 17 conheceu o prazer do sexo, sem amor e sem culpa. Que devassa, gostava de experimentar os meninos, as meninas, de pegar, amassar, lamber e beijar o ser humano até retorcer-se em orgasmos, por afeto e desejo, sem romantismo, sem planos, sem expectativas a não ser amar de corpo e alma. Tinha maus sentimentos sobre as pessoas que colocavam o amor dentro de uma planilha a ser executada. Não entendia enxoval, noivado e casamento. Como colocar o amor, a paixão, o desejo dentro de um palmo de plano? A essas alturas já era mal-vista e mal-falada, muito má e devassa. Não cabia em qualquer canto da comunidade, vagava solitária pelas ruas, banida do grupo dos bons, dos que fazem bem, dos que têm Jesus no coração. Falavam mal uns dos outros, trapaceavam, faziam média; do santo padre ao prefeito sem distinção de escolaridade ou crença, mas eles levavam Jesus no coração, eles oravam, todo dia faziam o bem para si mesmos e para o mundo inteiro: orando, comungando
juntos. A menina má, por mais que tentasse compreender os bandos humanos e suas estranhas regras de conduta, não conseguia deixar de ter sentimentos maus. Viajou o mundo inteiro procurando um lugar para deixar seu bicho visceral viver em paz, livre das meias-verdades, dos meios de interesse, mas só pagava cada dia mais caro por ter tirado Jesus do coração. Era tão má que questionava o perdão. Desde pequena era a única dos filhos que não pedia perdão. Os irmãos quando aprontavam, após apanharem jogavam-se aos pés do pai pedindo perdão. Ela não. Apanhava o dobro e quando o pai, exausto, pedia para ela gritar por clemência, só dizia uma frase: “Até antes de apanhar eu pediria perdão, agora você perdeu a razão”. Dito isso retirava-se para seu quarto e passava as noites lendo sob a luz da lanterna embaixo da cama. As leituras, como ela, não eram tementes a Deus. Deixou-se amaldiçoar pela família, pela igreja e pela sociedade. Um dia sumiu no meio da multidão. Uns dizem que enlouqueceu, outros que morreu bêbada, alguns afirmam que suicidou-se. Não importa, não tinha valor, era apenas uma maldita.
"Solidão é seu mestre, martírio sua recompensa" Stanley Keleman em Anatomia Emocional
Era má por ser livre! ;) Conto bacana.
ResponderExcluirMuito bom. Ingénua a menina, tadinha!!
ResponderExcluiruma pequena bacante, bêbada de mundo! lindo mesmo.
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