domingo, 30 de agosto de 2015

Amor, fase Terra




Cláudia Rodrigues

Bebês nos amam porque dependem de nós para sua sobrevivência primária.
Crianças nos amam porque precisam de nós, uma questão de sobrevivência secundária.

E então o que antes era necessidade, passa a ser uma dúvida, talvez uma escolha.
Adolescentes sentem no corpo e na alma que poderiam sobreviver sem nós, assim, hipoteticamente.
Isso é tão instigante para eles!

E finalmente o amor dos filhos pelos pais chega ao ápice na vida adulta, quando já sem precisar de nossa companhia, eles escolhem apenas amar, incondicionalmente e em doses homeopáticas.

O amor dos bebês e das crianças pequenas é repleto de idolatração.
Normal e esperado que idolatração e simbiose deem lugar a formas mais elaboradas de amor. Uma pena quando os genitores teimam em ficar no altar narcísico do amor por idolatria. Eles deixam de experienciar o amadurecimento do amor dos filhos, tornando-se déspotas, vítimas ou uma combinação dessas características.

O melhor do amor dos filhos por nós é o que eles têm para viver em cada fase. O decréscimo natural da necessidade poderia sempre ser visto e sentido como algo leve. Só porque apenas é.

Óbvio que a fase simbiótico narcisista da paternidade/maternidade de bebês e crianças é uma novidade relevante na vida de quem pega a estrada filogenética. Os bracinhos sempre abertos dos filhotes, a necessidade de contato físico constante, peito, colo, quentinho da cama, histórias para dormir.

Logo depois é a hora dos pequenos grandes feitos que nos fazem sentir heróis: o primeiro mergulho, a bicicleta, o be-a-bá, cavalgar, jogar bola, fazer fogueira e tudo o que nós, soberanos, ensinamos, orientamos, acompanhamos e promovemos. Sim, somos muito importantes, fundamentais.

E é tempo, são anos de dedicação e louros de importância e então vão chegando dias mais calmos, noites inteiras, viagens sem eles, leituras próprias, filmes próprios, a vida nos abre um vácuo de possibilidades e voltamos a um certo eixo que julgávamos perdido. E eles estão ali, por aqui, por aí, fazendo seus próprios eixos, ampliando suas possibilidades. Já não somos seu Sol e tudo está bem, nós somos apenas a Terra, porto seguro em eixo próprio pelo máximo que nos for possível, até o dia em que viraremos Lua, inexoravelmente.






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