sábado, 5 de fevereiro de 2011

Fashion bullying na volta às aulas





Cláudia Rodrigues

Esses dias coloquei na página do facebook declaração da minha filha de 8 anos sobre o fato de ter sofrido rejeição na escola. Recebi alguns e-mails de apoio, dicas de livro sobre como lidar com bullying, como protegê-la.

Achei engraçado porque ela não se sente vítima de bullying, está apenas tentando entender comportamentos sociais, aliás ela tem opinião sobre isso e não faz o jogo das amizades por interesse, ela mesma rejeita amigos que ora se achegam, ora se afastam por interesses imediatos, como um lanche diferente, um doce, um convite para ir em casa. Ela mesma se recusa a fazer o jogo de simpática a perder de vista, dos cochichos, excluindo-se do grupo que grita “Nuñes” para um colega. “Eu não gosto, mãe, quando eles chamam meu colega de Nuñes, não acho certo, meu colega não gosta, fica triste, então não dou risada junto, não acho graça e pronto”. Ela não é uma vítima, é uma pessoa de opinião.

Li recentemente o livro Bullying, resumo da tese de mestrado de Marcos Rolim. O assunto é sério, existe, precisa ser tratado, mas na outra ponta, a ponta de quem ouviu o termo via orelhada, começa a surgir a banalização do significado real do bullying, que se caracteriza por atitudes ligadas a perseguições físicas, psíquicas ou morais e não por rejeições, escolhas e preferências.

A rejeição é um sentimento natural no ser humano. Todos nós rejeitamos e somos rejeitados, faz parte do livre arbítrio, do direito de escolha e nem na idade adulta é fácil lidar com a rejeição, mas existe uma regra  básica de conduta racional que podemos praticar desde cedo e que faz parte do investimento na humildade: não agradamos gregos e troianos e podemos desfrutar do mesmo sentimento sem culpa; não nos agradam todas as pessoas sem distinção. 

Não devemos perseguir, sozinhos ou em grupos, um indivíduo ou um grupo e se isso ocorrer conosco devemos nos afastar do mal-estar e buscar o bem-estar entre os nossos amigos antigos ou novos. Cedo podemos ensinar às crianças que não devem ficar presas em implicâncias e antipatias, mas em alegrias e simpatias. Se não conseguem, se não conseguimos, um bom terapeuta pode ajudar no alívio dos sintomas oriundos de traços masoquistas de caráter. 

 Faz parte da vida de nossos filhos lidar com algum nível de adversidade na escola, tomar posições e, eventualmente, inevitavelmente e até felizmente, sofrer. Que sofram por serem rejeitados e se fortaleçam de fato, de dentro para fora. Que desde cedo possamos ser sensíveis o bastante para ajudá-los a sofrer mais por serem os rejeitadores do que os rejeitados, que cedo descubram os valores da solidariedade e da humildade para evitar as grandes humilhações que o ser humano colhe com a soberba.

O que não está certo e abunda nas escolas privadas é a superproteção; não ajuda a criança que está rejeitando, ao contrário afasta-a dos valores humanistas inflando mais e mais as sensações egóicas. A superproteção leva a criança que está rejeitando a deprimir o contato com as próprias vísceras, os sentimentos genuínos; ela passa a viver sem desejos em prol de vontades e vai inflando, inflando o ego sem encontrar alívio para sua ansiedade.

Superproteger só faz mal também para a criança que está sendo rejeitada; ela sente-se cada vez mais frágil se não pode encontrar forças e valores próprios para crescer de dentro para fora, não consegue criar corpo, entrar em contato com seu mesoderma, seus músculos, suas defesas egóicas.

Educação se faz orientando eticamente as crianças desde pequenas, com todos os "nãos" que elas têm direito, com amor e sem culpa, sem excesso de zelo, sem agressões, sem insultos, mas acima de tudo confiando e libertando para a vida.

Essa história de indagar a criança cada vez que ela sai da sala de aula é uma grande prova de desconfiança na capacidade dela de ser um sujeito da própria história, tanto quanto é falsa a ingenuidade da mãe que vê seu filho, sempre envolvido em brigas e acusações, como a eterna vítima em potencial.


7 comentários:

  1. Ano passado passei por isso. Meu antonio, de 4, tinha pavor de um colega que era grandão e o líder da turma. Apanhava, era chamado de nenem, era excluído das brincadeiras. Fui na escola diversas vezes e a direção via tudo como natural, como normal nessa idade. Como lá não tive apoio, tratei de fortalecê-lo em casa, dizendo exatamente o q vc sugeriu: a busca pelos amigos legais, pelas pessoas que queriam a companhia dele. Só não o tirei da escola pq o outro menino saiu e sei q independente da escola, a diretoria iria se portar da mesma forma, infelizmente. De qquer forma, estamos trabalhando pra passar a ele valores éticos e humanos. Tomara que adiante quando ele encontrar outros coleguinhas como o grandão...

    Bjos,

    Luiza

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  2. Pois é Luiza, o melhor antítodo contra o bullying é a formação ética.

    Confesso que precisei me segurar muitas vezes quando meus dois primeiros filhos eram pequenos para não mandar revidar, hoje estou absolutamente convicta de que foi a melhor opção. É incrível como eles aprenderam a escolher amigos, companheiros, só rola gente legal aqui em casa, uma moçada que tem a maior sintonia conosco e eu fico tranquila quando eles estão na rua porque sei que andam com povo de onda boa, mas não foi um aprendizado sem dor aprender a evitar os egocentristas e suas necessidades de formar gangues, afinal é um jogo duro de poder e a maior parte das crianças se submete para "ficar bem na foto".

    Com o tempo e o fortalecimento da autoestima por meio do afeto, do contato genuino, de valores e exemplos, ocorre algo muito interessante que eu daria o nome de incorruptibilidade sócio-emocional.

    Agora, que os valentões precisam de ajuda, isso precisam e normalmente o foco do problema está na família inteira e na falta de visão que a família tem de si mesma e de seus padrões de comportamento egocentrados.

    Beijo grande em você e nos seus pequenos notáveis.

    Cláudia

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  3. Ma poule!
    Que legal. Gostei bastante de se falar sobre a rejeição e sobre ser rejeitado. Não tinha atinado para isso, do quão libertador é saber que não se agrada a todos....
    Cada vez que entro aqui é um aprendizado novo e renovador.
    Fantastique!
    beijos
    Renata

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  4. Oi Renata...mas é tão bom quando nos acolhem, gostam da gente, né? Acho isso daí um teorema bem difícil de desenvolver, o equilíbrio nessa história de lidar com a rejeição quando nós somos as "vítimas".

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  5. Oi querida! Que bom ver vc falando sobre isso! Sabe... procurei me preparar para muita coisa por aqui... até fui um tanto exigente com meu marido para nos trazer para cá antes da casa estar pronta... pq eu achei o fim chegar aqui depois do início das aulas, cidade nova, escola nova, tudo novo, e com as panelinhas já formadas... enfim, chegamos na segunda semana de aula. E foi bem pior do que eu tinha imaginado. Tem um rapazinho na turma dele que achou sensacional chamar o Fe de "branquelo nojento de cabelo feio e burro". (O burro era por conta da turma já saber letra cursiva e ele ainda não). Pois o Fe ficou tentanto aguentar e resolver sózinho, até o dia em que ficou com uma bela dor de garganta e teve que falar... mas não queria dizer quem era... dizia que eram todos menos um. Felizmente a professora e a diretora foram bastante atenciosas e as conversas na sala foram calmas... e a situação piorou pq o valentão passou a usar a desobediência como prova de coragem: - "se vc quiser ser meu amigo vai ter que xingar o Felipe". Pois desta vez o Fe resolveu sozinho: falou pra todo mundo que podiam xingar que ele não ligava! Aí teve um que falou: - "não vou xingar pq isso é errado!" Aí mais um, mais um... e pronto: ele ficou sabendo de quem vale a pena ser amigo! Meu filho lindo!

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  6. Claudia,

    excelente txt! Estou para escrever sobre este assunto.

    Meu filho tinha um coleguinha que desde o berçário recebia pouquíssima atenção em casa e com isto era agressivo na escola. A escola fez um acompanhamento, a psicóloga da escola conversou com a família e foi tudo melhorando...

    No ano passado ele deve ter passado por algum momento difícil e rolou uma recaída. Aos 3 voltou a morder amiguinhos, empurrar.

    Minha atitude anterior era sempre falar p/ procurar a professorae brincar com quem ele gostasse, mas desta vez ele ficou com medo e não queria ir na escola.

    Li sobre a experiência de uma mãe americana e repliquei em casa. Fiz um teatrinho onde eu era o menino que empurrava e mordia. Conversei com ele antes falando que ele era forte e sabia se defender. QUe caso o menino insistisse deveria segurar firme seus braços e falar forte "Não quero! Não faça!" Ele se sentiu mais forte e nunca mais reclamou ou mostrou receio de ir na escola.

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  7. É isso. Estou contente de ver gente buscando saidas por meio dos reforços positivos, de pontuações e até de silêncios. Ma nova escola da Tami está rolando uma coisa bem legal de investimento em solidariedade. Também percebo que quando e a escola trabalha bem os conteúdos, com desejo de despertar nas crianças o desejo de aprender, sobra pouco tempo para essas guerrinhas egóicas.
    O mais curioso é que nessa nova escola ela é mais livre para ir e vir, as crianças têm mais autonomia. Bem, de fato, essas instituições que trabalham com tudo na epressão e no controle é claro que depertam mais comportamentos de desafio às regras. Gente dura, gente quebrada.

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